Por que Tear das Feiticeiras?
Apesar do nome do nosso templo ser TEMENOS TRADIÇÃO MISTÉRIOS DE TESSÁLIA, utilizamos o nome mais popular – TEAR DAS FEITICEIRAS. Para que chegássemos a uma escolha do nome do coletivo, o caminho percorrido fora de muitas pesquisas pautadas tanto na cultura helênica quanto nos fundamentos da bruxaria. Tendo sempre como cerne o resgate e a ressignificação de uma ancestralidade difamada e rechaçada, buscava-se também um termo que remetesse à comunicação e a conexão entre mulheres.
A palavra ‘Tear’ num primeiro momento remete ao aparelho para tecer; a máquina destinada a tecer fios, transformando-os em panos. Entretanto, o ato de tear vai além do físico, há toda uma simbologia, inúmeras figuras mortais e imortais se associam a esse exercício. As Moiras que tecem os destinos; Aracne que no mito era uma jovem tecelã que vivia na Lídia e foi castigada por Atenas; Helena de Tróia, Penélope e a bruxa Circe. Mesmo que as mulheres da Antiga Grécia sob isolamento doméstico e um silenciamento, ainda sim, elas encontraram outro tipo de linguagem: a tecelagem. Esta foi uma expressão muito utilizada por elas para terem suas narrativas registradas, um ato solitário e introspectivo, podendo-se comparar a uma criação poética.
Além de representar a narração dessas histórias, as tecelãs também podem salvaguardar as memórias da sua ancestralidade ou produzir indumentárias que garantam a proteção ao sol e ao frio e que também auxiliem nas conexões astrais como, por exemplo, o xale sagrado que é uma peça de resgate a ancestralidade, retorno ao lar e aos braços da Mãe-Terra e significa sentir-se envolvido pelo seu amor e proteção.
A tradição mítica de mulheres tecedeiras também é uma analogia a criação da vida, pois o que se faz com o fio da sua escolha? Pode desfazer nós do passado, juntar fios com outras pessoas, tecer a Teia da vida. Tornar-se uma mulher tecelã gera uma capacidade e responsabilidade de criar o nosso destino seja no individual, quanto no coletivo.
As tecelãs, na Bruxaria, são uma das mãos criadoras da Grande Teia da vida e que percebem nas entrelinhas as conexões sociais de todos os seres, em todos os tempos e planos. Insubordinadas, invocam seus poderes ancestrais sem solicitarem permissões, e os praticam a margem de uma sociedade que insiste em suas inexistências. Além de trabalharem a serviço da Terra que é o corpo da Grande Mãe, voltam-se também aos animais, aos desamparados, as minorias, aos oprimidos e aos esquecidos. Com suas tesouras, cortam os fios com o comércio e o consumismo vil e se entrelaçam com o que realmente importa, com os marginalizados.
TECELÃS são agentes participativas do agora, enquanto por este plano estiverem. A Bruxaria é um ato Político, basta olhar para o passado para relembrar das vidas ceifadas pela ganância e misoginia. Sendo assim, ao despertarem para essas experiências e ao resgatarem as histórias das tecelãs, percebem o poder e responsabilidade que se tem em mãos.
Ainda no decorrer da pesquisa, notou-se que em partes diferentes do mundo, em diversas culturas existia a figura de um fantasma-demônio noturno feminino que aparecia em forma de ave (coruja) e chorava à noite se posicionando com os pés para cima e a cabeça para baixo (similar a um morcego) trazendo mau agouro. Tribos nativas norte-americanas como Cherokee e Menominee ou civilizações da Mesopotâmia, Peru, Alasca, América do Norte, África Central e Malásia relataram imagem da demônia noturna que faminta, matava bebês, parturientes, homens jovens e mulheres com recém-nascidos. Alguns exemplos são: as lâmias helênicas, os vampiros eslavos, no hebreu Lilith, e no árabe Ghiil, etc.

A mais antiga menção à criatura foi na cultura grega, na obra perdida Ornithologia, do autor grego Boio, parcialmente preservada nas Metamorphoses (Μεταμορφώσεων Συναγωγή), de Antoninus Liberalis, onde a ‘strix’(στρίξ) pode ser resumida da seguinte forma: a- uma devota de Ártemis; b- Um afrodisíaco; c- Conectado com magia e bruxaria.
A figura da Strix, ainda na antiguidade grega clássica, começa a se referir também às bruxas, com uma aparência semelhante a humanos. Como apresentado no trabalho ‘Strix-Witch’ de Daniel Ogden da Universidade de Cambrigde:
No oriente grego, ela era uma mulher que voava a noite, em forma de coruja ou em alma projetada, para penetrar nos lares por meios sub-reptícios e, assim, devorar, estragar ou roubar os bebês recém-nascido dentro deles. (2021).
Essa relação direta também ficou explícita na cultura romana. Em Os Fastos de Ovídio é abordada a possibilidade de as strix (striges ou strigae) serem pássaros da natureza, mas também, mulheres que por meio de magia e encantamentos transformavam-se na ave. Sexto Pompeu Festo, no final do século II, definiu strix como “mulheres que praticam bruxaria” ou “mulheres voadoras”.
Poetas romanos como Horácio, Propertius e Lucan, descrevem que as penas das strix são ingredientes majickos, usados em poção do amor da bruxa Canidia; ingrediente na mistura rejuvenescedora preparada no caldeirão de Medeia ou instrumento utilizado no encantamento de Erictho de Tessália quando recorria a necromancia ou previsão do futuro.
A lenda da strix sobreviveu até a Idade Média, endossada, sobretudo pelo caçador de bruxas, Gian Francesco Pico della Mirandola que escreveu um livro para justificar suas atividades em 1523 e definiu as bruxas simplesmente de strix/striges (Grécia).
Ainda que a associação de bruxas com corujas transmitisse um sentido pejorativo, a ave também simbolizava a reflexão, sabedoria, o conhecimento racional e intuitivo. Para os gregos a noite era o momento propício para o pensamento filosófico.
Dito isso, nosso símbolo é uma coruja com duas agulhas de costura, representando as STRIX TECENDO O SEU PODER PESSOAL.

Syrinx Sycorax